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Uma bailarina brasileira em Nova York – Luísa Righeto é a mais nova artista associada da Infinity Dance Theater

Crédito da foto: Acervo pessoal

A bailarina brasileira Luísa Righeto está há oito anos nos Estados Unidos, onde se graduou pela Escola da Martha Graham, em 2016. Como artista da dança moderna, vem conquistando espaços importantes e agora pode ser vista por um público maior no clipe Indecisão (clique aqui para assistir), mais novo trabalho da cantora Nina Alves, também brasileira e radicada em Nova York, que tem a dança como guia de seu roteiro. Luísa tem muita história para contar e nesse bate-papo revela detalhes de sua participação no clipe e pontua momentos especiais da carreira longe do Brasil, como: sua atuação na Infinity Dance Theater, recentemente nomeada artista associada; sua carreira como professora de dança criativa e dança moderna para crianças nas escolas públicas de Nova York. Ela também faz reflexões sobre a importância da dança moderna, no Brasil e nos Estados Unidos, e revela suas vontades para o futuro. Aos 32 anos, seu amadurecimento na dança fortaleceu seu encanto pelo movimento: “Danço para sentir cada músculo do meu corpo, para transbordar em movimento como o oceano. Danço para fazer poesia”. A seguir, confira os melhores trechos. 

Você está nos USA há muitos anos e tem feito muitas coisas. Como aconteceu o convite para participar deste clipe da cantora Nina Alves? 

Em agosto de 2022, participei de um evento com a Nina Alves. Ela foi contratada para cantar, eu modelava e dançava. Em novembro do mesmo ano, Nina me convidou para o trabalho com o clipe da música Indecisão. Ela gravou sua versão em português do original de Natalie Imbruglia e a música passou a tocar nas rádios do Brasil. Sua ideia era trazer bailarinos da dança contemporânea e moderna para dar vida à letra da música. Ela gostaria de contratar dois bailarinos, então estendi o convite para o bailarino brasileiro Alexandre Barranco que também mora em Nova York e é de Campinas, interior de São Paulo, minha cidade natal. Todos os envolvidos no videoclipe são brasileiros: Nina, eu, Alexandre e o Raphael Felisbino que foi o diretor de vídeo e fotografia. 

Nina Alves é Pop, Jazz, Soul, Folk. Como construíram a movimentação para o clipe?

A inspiração para a movimentação veio primeiramente da música: da melodia e da letra, e depois do espaço em que a gravação ocorreu. Eu e Alexandre tivemos ensaios anteriores ao dia da gravação para, por meio da improvisação a dois, chegarmos a uma frase coreográfica base que mais tarde serviria para o refrão da música. O videoclipe teve momentos coreografados e momentos de pura improvisação como nos solos de cada bailarino em diferentes espaços como quartos e salas. 

Você pode nos contar um pouco sobre o seu trabalho na Infinity Dance Theater? 

A Infinity Dance Theater é uma companhia de dança com dançarinos com e sem deficiência dedicados a expandir os limites da dança, com direção de Kitty Lunn. Nesse último ano, ela me nomeou artista associada da companhia, devido às minhas colaborações em relação a sua metodologia “Transposição das técnicas de Balé, Graham e Horton para bailarinos em cadeira de rodas”. Conheci o trabalho da Kitty em 2017, quando ainda dançava com a Alison Cook Beatty Dance: participava de um dos ensaios de Mahaway: Spring Eternal, coreografia que contava com a participação de outros artistas, como Kitty. Ela dançava em uma cadeira de rodas e fiquei fascinada ao vê-la em cena. Nesse encontro, perguntei se poderia assistir ao ensaio de sua companhia. Ela não apenas aprovou que eu assistisse ao ensaio como me convidou para fazer parte da peça que estava criando. Desde então, danço com a Infinity e venho apresentando palestras e workshops de dança ao lado de Kitty sobre sua metodologia. Como me formei na escola da Martha Graham, meu foco é na transposição da técnica da Graham para alunos e bailarinos que utilizam a cadeira de rodas.

E como é sua atuação nessa companhia? Qual a rotina?

Na Infinity Dance Theater sempre começamos com uma aula de dança de duas horas, com música ao vivo, em que fazemos alguns exercícios de Qi Gong, barra de balé clássico e adágio no centro, trabalho de chão de Graham e exercícios de Horton. Depois da aula, criamos e ensaiamos novas peças. Como parte do processo coreográfico, contamos com o músico da companhia, William Catanzaro, para compor a partir do tema selecionado. Depois que a música é criada, começamos a moldar os movimentos e as ideias, criando uma coreografia.

“Danço para fazer poesia com meu corpo. É fascinante. Eu acho incrível o que podemos criar com nossos corpos, e como podemos nos mover de maneiras ilimitadas. Eu sou definitivamente uma amante do movimento.”
Luísa Righeto

O mais recente trabalho que você e Kitty criaram é o dueto intitulado Etude. E nessa trajetória também tem outros trabalhos, certo? 

Etude é um dueto dançado por mim, em pé, e por Kitty na cadeira de rodas. Ele foi criado com o objetivo de demonstrar como inserimos as técnicas do balé e da dança moderna em uma coreografia, da sala de aula para o palco. Pode-se dizer que é o resultado da metodologia que Kitty traz para a Cia. Etude estreou em Atlanta, Georgia, no fim do Workshop-Palestra “Transposição das Técnicas da Dança Clássica e da Dança Moderna para Alunos e Bailarinos que usam cadeiras de rodas”, realizado na Conferência da Organização Nacional de Educação em Dança (NDEO – National Dance Education Organization). Nesses workshops, demonstro a técnica do balé e da dança moderna em meu corpo, e Kitty as técnicas em seu corpo usando a cadeira de rodas. Com a Infinity, também apresentei Ghosts in the Machine, com coreografia de Kitty Lunn, e MAHAWAY: Spring Eternal, peça completa de Alison Cook Beatty. Durante a Pandemia, realizamos dois projetos online: “The Women’s Stories Project” e “Infinity Breathing Together”. 

Você é formada pela técnica e pela escola da Martha Graham. Como é a transposição dessa técnica para os corpos da companhia?

O trabalho de transposição é para bailarinos que usam a cadeira de rodas, que tiveram lesão na medula espinhal, e perderam a movimentação da metade inferior do corpo. Grande parte dessa técnica, transposta para o corpo desses bailarinos, é a parte dos exercícios de chão. Eu sempre me lembro de uma frase que  Kitty diz: “às vezes um braço é uma perna, às vezes um braço é um braço”. Eu preciso fortalecer as minhas pernas e o meu centro, enquanto os bailarinos e bailarinas que usam cadeira de rodas precisam fortalecer a parte superior do corpo, das costas e o centro. A pergunta é simples: o que essas pessoas precisam fazer para fortalecer seus corpos e dançar? Portanto, a transposição das técnicas da dança para esses bailarinos acontece na parte superior do corpo: caixa toráxica, braços e cabeça. Também exploramos diferentes formas de giros que podem ser realizados pelo bailarino/bailarina ao movimentar sua cadeira de rodas de diferentes maneiras. 

Você também trabalha com aulas de dança criativa e dança moderna para crianças nas escolas públicas de Nova York. Conte um pouco deste trabalho. 

Eu realizo curtos projetos de dança que geralmente duram 10 semanas e finalizam com uma performance dos alunos para mostrar os resultados do processo criativo e o que foi trabalhado. Esses projetos são mediados por uma companhia de dança-educação/empresa que me contratam como professora-artista de dança. Em minhas aulas, procuro trabalhar a dança criativa, e os conceitos básicos da dança moderna. Um exemplo é trazer os conceitos de Graham como contraction, release, spiral (espiral), explicá-los e relacioná-los com algumas imagens para então as crianças explorarem uma movimentação inspirada nestes conceitos. Eu também procuro mostrar vídeos de dança de grandes companhias e fotos de certos movimentos para ensinar aos alunos o fundamento da técnica moderna e praticá-los de forma modificada e correspondente à idade dos alunos. A importância desse trabalho para mim é poder apresentar a dança moderna para as crianças tornando-a mais conhecida e não deixando-a restrita ao estúdio.    

Você fez carreira fora do Brasil com uma técnica moderna. Como você enxerga a vivacidade dessa técnica nos Estados Unidos e fora? E no Brasil, falta dança moderna?

Aqui nos Estados Unidos, mais especificamente em Nova York, a técnica da dança moderna é muito procurada. Nova York é um dos berços da dança moderna e isso facilita o interesse das pessoas. Aqui temos a Martha Graham Dance Company, Limón Dance Company, Alvin Ailey Dance Theater. Cada uma dessas companhias está vinculada a uma escola de dança voltada à técnica de um desses grandes artistas. Vários artistas atuais passaram por essas escolas da dança moderna e trazem consigo a base que cada uma dessas técnicas lhes proporcionou. 

No Brasil, e em outros lugares do mundo, a procura por essa técnica moderna ainda é insuficiente. Novas danças foram surgindo ao longo da história e abrindo novos caminhos e olhares. Essa falta de interesse pela dança moderna pode ser por uma ideia pré-estabelecida de que a dança moderna é ultrapassada ou que é uma técnica difícil de ser dominada. Mas, por quê? Pode ser por falta de acesso, falta de divulgação e de entendimento da dança moderna, número pequeno de profissionais qualificados e público-alvo. A técnica de Graham, por exemplo, é realmente difícil, mas traz uma beleza e uma qualidade de movimento únicas. Se fossem entendidos seus conceitos básicos – a organicidade dos movimentos em coordenação com a respiração e que cada movimentação foi criada de dentro para fora -, talvez os interesses se elevassem.

 Qual seu sonho e planos para o futuro?

A longo prazo, gostaria de continuar e melhorar o trabalho que faço com a Infinity Dance Theatre. Eu me vejo ensinando dança e coreografando para alunos com habilidades variadas, para diferentes corpos. Também vejo possibilidades no trabalho com a dança como forma de reabilitação, continuar o legado da dança moderna e espalhar os meus conhecimentos da técnica da Martha Graham.

 

Sobre Luisa Righeto

Foto: Marisa Abel

Luísa Righeto é bailarina e professora formada pelo método de Martha Graham. Vive em Nova York desde 2014 e recentemente foi nomeada artista associada da Infinity Dance Theater, companhia com a qual atua desde 2018. Também ensina balé, dança criativa e técnica Graham. Na cidade americana, fez parte do projeto House of the Roses, dançou com a Coyote Dance Company e com a Alison Cook Beatty Dance. Luísa começou seus estudos em Campinas, ainda criança. Aos 17 anos, mudou-se para São Paulo onde fez o curso de Dança pela Universidade Anhembi Morumbi (2012). No Brasil, como bailarina, dançou no Grupo Jovem Cia Danças Claudia de Souza e na Caleidos Cia de Dança, ambas em São Paulo. 

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