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A[MAR]KALUNGA, com direção artística de Maria Emília Gomes, faz apresentações no Teatro Flávio Império

Crédito da foto: Ian Fraga

A[MAR]KALUNGA, trabalho dirigido e coreografado por Maria Emília Gomes, mergulha na experiência da travessia do oceano Atlântico dos navios negreiros para reativar a memória sem apagar o amor, a possibilidade de inventividade e a celebração. Com dez bailarinos e bailarinas em cena, ao lado de dois músicos, a obra é resultado da residência artística de três meses proposta pelo projeto Colibri, e as apresentações acontecem entre os dias 19 e 22 de junho, no Teatro Flávio Império. Os ingressos são gratuitos e podem ser retirados uma hora antes do espetáculo.

Contemplado pelo 37° Edital de Fomento à Dança para a cidade de São Paulo, o projeto está dividido em três etapas e A[MAR]KALUNGA faz parte da segunda fase (a primeira etapa, artístico-pedagógica foi dedicada às infâncias e já finalizada, a última fase será um solo da própria Maria Emília previsto para novembro).

O espetáculo dá continuidade às pesquisas cênicas iniciadas em A[MAR]KALUNGA: AFROGRAFIAS DANÇANTES, performance criada por Maria Emília no programa “Arte do Amanhã – Tecnologias Afetivas”, no Museu do Amanhã, em 2024. “Kalunga”, palavra com raízes na língua banto, é associada a uma divindade relacionada à força da natureza, em especial o mar, mas também pode estar ligada à morte. Entre seus significados, pode ser interpretada como força completa em “si mesma” e também é usada para falar da profundidade do mar: “Kalunga grande” passou a denominar o grande cemitério que o mar se tornou com o tráfico de mais de 300 anos de escravização dos povos de África e mais de 12 milhões de pessoas mortas nessa travessia atlântica.

A partir dessa dualidade, Maria Emilia colocou perguntas chaves para sua pesquisa em relação à travessia do oceano atlântico nos porões dos navios negreiros: “Como criar outros imaginários sobre a experiência Atlântica Negra?” ou “Como transformar a dor da escravidão em atos criativos?”.

A[MAR]KALUNGA também parte dos “mesmos desejos” do trabalho anterior, como coloca a coreógrafa, mas são resultados diferentes. “O conceito e a perspectiva dramatúrgica ainda transitam no entendimento dessa travessia, assumimos o porão, entendemos que ele pode mudar de águas para falarmos de oportunidades, de reivindicar a celebração enquanto possibilidade, mas agora essa perspectiva passa a ser coletiva, porque somos muitos”, revela Maria Emília.

Nessa etapa de criação, o elenco, formado por artistas nesgros, indígenas, uma pessoa amarela, uma colombiana e uma pessoa branca, participou de uma série de atividades para a construção da obra: vivências com mestre de capoeira Pedro Peu, com a iluminadora Dida Genofre e com o figurinista Vitor Flausino; uma visita guiada ao Sítio da Ressaca, um quilombo de travessia; aulas de Dance Hall com o artista Ruan Trindade e de dança contemporânea com o artista Ricardo Januário. Ao lado dos músicos selecionados, o grupo também se aproximou do canto e de alguns instrumentos. “A música fez parte de nossas vivências como possibilidade estética. Temos pessoas que cantam, outras têm experiência em musicais, há também os que tocam instrumentos, os que são da cultura do passinho, da cultura do funk. Queremos pensar a dança para além do movimento”, diz.

Em cena, o palco se apresenta como porão dos navios e, ao longo do espetáculo, os intérpretes dançam e constroem narrativas com movimentos estruturados a partir de danças afro-diaspóricas, produzem “sal” (suor) e debocham como possibilidade de, mesmo com tanto, celebrar a vida com inventividade e amor. “O porão do navio forjou em nossas corpos muitos dos seus desejos ocidentais, mas não foi capaz de apagar nossa capacidade inventiva e encantada de celebrar vida com dança – dança entendida com conceito ampliado, pois se apoia em cosmologias nas quais dançar também é tocar, cantar, cuidar, cozinhar e comer”, diz a diretora.

Na troca coreográfica, a diretora conta que em algumas partes sugeriu sequências e os artistas foram identificando como funcionava em cada corpo; há outras em que cada um trouxe suas referências. A imagem do sal, presente na performance no Museu do Amanhã e na pesquisa de Maria Emília, volta para este trabalho na construção cênica, refletindo algo que cura e dá sabor, mas lembrado como aquele que era colocado na ferida provocada pela chibata no passado colonial que ainda não passou.

O projeto conta com o núcleo artístico composto por Douglas Iesus (direção e orientação), Michael Yuri (músico Percussionista), Dida Genofre (iluminadora), Mari Ser (artista e fotógrafa), Lemuris (assistente de produção) e Daniela dos Santos (representante jurídica e proponente) e conta ainda com a produção de Iolanda Costa.

Direção artística

Maria Emília Gomes é bailarina, criadora e coreógrafa. Profissionalizou-se como bailarina intérprete pelo Balé Jovem do Palácio das Artes (MG) e como intérprete-criadora pela Escola Superior de Dança do Instituto Politécnico de Lisboa/PT. É Licenciada em Dança pela UFMG e em Estudos Gerais: Artes e Culturas Comparadas pela Universidade de Lisboa. Em 2024, foi coreógrafa residente no Programa Feminino Plural realizado pelo programa IBEROCENA, em Santa Eulalia de Gállego/Espanha; e artista residente no programa “Artes do Amanhã: Tecnologias afetivas”, realizada no Museu do Amanhã no Rio de Janeiro/RJ (2024). Em 2023, foi artista residente na École des Sables/Senegal, no Programa de Formação África-Diaspórica 2023. A artista, premiada pela Cooperativa Paulista de Dança no XII Prêmio Denilto Gomes como destaque em Dança em 2024, já atuou como bailarina em diferentes companhias públicas (BJMG e Cia Municipal de Dança de Porto Alegre/RS) e em coletivos independentes em Minas, Rio Grande do Sul e São Paulo. Também foi artista-docente do curso de Coreografia (Dramaturgia e Direção) na SPED – São Paulo Escola de Dança (2024); artista orientadora no Programa Qualificação em Dança do Governo do Estado de São Paulo em 2022, e coordenadora artística do Ayodele Balé entre 2019-2023, projeto idealizado e dirigido por Milton Kennedy. É mestranda em Artes da Cena na UFMG e pesquisa danças urbanas desde 2018.

Sinopse

A[MAR]KALUNGA é uma obra de dança contemporânea, dirigida e coreografada pela artista Maria Emília Gomes. Com dez bailarinas/es/ em cena, orquestrada por dois músicos percussionistas, a coreografia sugere uma travessia: retorna ao atlântico negro e situa ancestralidade e diáspora a partir daqueles que foram sequestrados de África e amontoados no porão do navio. Em cena, os intérpretes dançam e constroem narrativas com movimentos estruturados a partir de danças afro-diaspóricas, produzem “sal” (suor) e debocham como possibilidade de, mesmo com tanto, celebrar a vida com inventividade e amor. A[MAR]KALUNGA é mandinga de encantados cuja dramaturgia reverencia aqueles que habitam as profundezas do mar (mais de 12 milhões de pessoas foram mortas na travessia atlântica por mais de três séculos de escravização dos povos de África). E, como no balanço das marés, a obra transporta o público para dentro do porão do navio, para o fundo do mar ou simplesmente situa a sala de espetáculo como lugar de encontro onde é possível, ainda hoje, nos encantamos com dança.

Ficha técnica

Concepção, coreografia e direção artística: Maria Emília Gomes
Elenco: Dandara Pilar, Débora Carolina Vaz, Fabricio Enzo, Fiama, Mayí, Alejandra Moreno, Ricardo Ura, samantha kabocla, Tati Cassiano, Vik Alves
Criação musical e percussão: Maicou Yuri e Anderson Sales
Trilha adaptada: Curi-curi Tum-tum, compositor: Tambolelê
Criação e operação de luz: Dida Genofre
Figurino e maquiagem: Vitor Flausino
Fotografia e registros: Mari Ser
Designer gráfico e fotos de divulgação: Ian Fraga Muntoreanu
Professores convidados: Ruan Trindade e Ricardo Januário
Provocações e guianças: Mestre Pedro Peu
Técnico de som: Fael Mares
Terapeutas: Ma Devi Murti e Silvia Oliveira
Confecção de instrumentos: Oficina do Dedéco
Intérprete de libras: Thuany Alves
Produção executiva: Iolanda Costa
Assistente de produção: Lemuris (Vanessa Elias Lemes)
Costureira: Andreia Fantazia
Coprodução: Teatro Flávio Império
Assessoria de imprensa: Flávia Fontes Oliveira
Terapeutas: Ma Devi Murti e Silvia Oliveira
Confecção de instrumentos: Oficina do Dedéco
Produção Audiovisual – Pri Magalhães, Pauliana Reis, Claudia Magalhães e Yan Guedes

Serviço

A[MAR]KALUNGA
De 19 a 22 de junho de 2025
Quinta, sexta e sábado, 20h; domingo, 18h
Local: Teatro Flávio Império
Endereço: R. Prof. Alves Pedroso, 600 – Cangaiba, São Paulo
Ingressos: Grátis – distribuídos uma hora antes na bilheteria
Informações: (11) 2621-2719
Capacidade: 206 lugares
Classificação indicativa: 12 anos

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